O
Teatro da Crueldade é o nome dado à teoria proposta pelo ator, diretor, poeta e
teórico francês Antonin Artaud (1896-1948), surgida na década de 20, como uma
maneira de fazer uma crítica à cultura do espetáculo e à própria forma que a
sociedade ocidental enxergava o mundo.
A
origem deste pensamento teve influência dos movimentos dadaísta e surrealista.
Em 1932, o primeiro Manifesto do Teatro da Crueldade é publicado, e, em 1938,
em seu livro “O Teatro e Seu Duplo”, ganha as feições que seriam disseminadas
mundo afora. Mesmo depois de algumas experimentações práticas, foi apenas na
década de 60 que artistas dispostos a reinterpretar suas ideias ganharam força.
No Brasil, o maior expoente deste formato foi o Teatro Oficina, entre 1967 e
1972.
Além
de se opor às características do teatro tradicional, o Teatro da Crueldade
critica a racionalidade do mundo ocidental. Entre as suas ideias, estava a
concepção de um novo teatro e uma nova apreensão do universo, ligada ao nível
pré-verbal da psique humana. Para Artaud, o teatro deveria abalar as certezas
adotadas pela sociedade. Em uma análise sobre as ideias de Antonin Artaud, Ivam
Cabral, diretor executivo da SP Escola de Teatro – Centro de Formação das Artes
do Palco, diz que é daí que surge o termo “crueldade”, afinal, ao se libertar
das certezas, só resta a insegurança e o medo.
“O
processo de criação aproxima-se sempre da angústia, que é um sentimento ligado
ao desconhecido. Tem-se medo de algo; angustia-se de uma sensação apenas. É a
cultura das sensações (do imaginário, do sensível), não da cultura erudita. Mas
um teatro que vai do sensorial ao intuitivo. Não é um teatro físico, apenas.”
Segundo
escritos de Artaud, o teatro não deveria ser entendido como entretenimento. A
caracterização psicológica das personagens, a sobrevalorização do enredo e o
predomínio da dramaturgia sobre a encenação eram outros pontos combatidos por
ele.
Ainda
mais fundo, o autor propunha uma interação entre o palco e o público e entre
atores e espectadores. A encenação deveria ocupar todo o espaço: “um teatro que
não se confina num palco, que pode se metamorfosear em qualquer situação”, como
coloca Ivam Cabral. Por fim, em Artaud o teatro ganha um caráter ritualístico,
que seria capaz de curar a angústia e reintegrar a totalidade física e
espiritual do homem.
Grande
parte destas ideias reflete a própria trajetória pessoal de Artaud.
Frequentemente visto como louco, foi internado em vários manicômios; sofria com
intensas dores de cabeça; era viciado em opiáceos; e desenvolveu um câncer no
final da vida, falecendo aos 51 anos.
Desde
sua partida, alguns artistas e grupos tentaram reproduzir seus conceitos. Peter
Brook, na década de 60, comandando a Royal Shakespeare Company, explora a
intensidade de jogos físicos e a exteriorização da angústia, como em
“Marat-Sade”, do dramaturgo alemão Peter Weiss.
Outra
companhia que se aprofundou nos estudos de Artaud foi o Living Theatre. Dotado
de uma ideologia anarquista e com o objetivo de transformar a sociedade,
propunha a unificação entre teatro e vida. Embora estivessem experimentando
essas tendências desde os anos 1950, é na década seguinte que seus trabalhos
ganham mais força. “Frankenstein” e “Paradise Now” são suas encenações mais
famosas.
O
Teatro Oficina, que teria contato com o Living Theatre e trabalharia com ele no
Brasil, também colocou em prática os preceitos do Teatro da Crueldade. “O Rei
da Vela”, “Roda Viva” e “Na Selva das Cidades” demonstram toda a agressividade
e radicalização do grupo.
Já
nos anos 1970, elementos do Teatro da Crueldade se tornam referência para
diversas manifestações teatrais. O Teatro da Vertigem, por exemplo, explora
alguns deles, como a experiência corpórea dos atores, a utilização de espaços
teatrais não convencionais e a integração especial entre palco e plateia.