domingo, 11 de setembro de 2011

PLANEJAR UM PLANO

PLANEJAR UM PLANO

Não adianta nada fazer um plano lindo, se ele não contribui com a história, com a emoção do que está sendo contado. Antes de falar mais sobre a importância dos planos a serviço de contar a história, de passar a emoção, vamos entender o que é um plano.

Um plano é o trecho de filme que começa quando a câmera é ligada e termina quando a câmera é desligada. Quer dizer, se eu ligo a câmera, e um personagem, com uma lágrima no rosto, diz “Vou pegar um táxi”, e eu desligo a câmera, tenho um plano. Se ligo a câmera, novamente, quando o personagem atravessa a rua e desligo quando ele chega à calçada, tenho outro plano. Se ligo a câmera quando ele entra no táxi e desligo quando o táxi parte, tenho mais um plano.

Da mesma forma, se ligo a câmera, o personagem diz “Vou pegar um táxi”, se levanta, caminha na calçada, atravessa a rua, faz sinal para um táxi, entra no táxi, o táxi parte, e eu desligo a câmera, tenho um plano maior. Enfim, sabendo que uma cena é um conjunto de ações e/ou diálogos que acontecem num mesmo lugar e num mesmo tempo, podemos dizer que uma cena é formada por vários planos. Ou por um mesmo plano que mostra toda a seqüência de acontecimentos. Simples assim.

O problema começa quando temos de definir, por exemplo, quando ligar e quando desligar a câmera. E onde, exatamente, essa câmera precisa ser colocada para captar as ações desse personagem que vai pegar um táxi. Eis um dos grandes dilemas do diretor.

Bem, é muito importante que todo diretor faça um planejamento daquilo que deseja filmar. Que chegue ao set sabendo (ou pensando que sabe) o que precisa, tendo uma ideia clara do que é a cena e de quais imagens precisará para contar a história.

Esse trabalho começa na leitura do roteiro, em que o diretor analisa a cena imaginando cada movimento, cada expressão, cada objeto que compõe o cenário, cada fala do personagem.

Vamos imaginar que nosso personagem do táxi é um rapaz que acaba de receber a notícia da morte do pai, a quem não vê há muitos anos. Ainda confuso, ele se senta no meio-fio e observa os carros que passam pela rua.

O desafio do diretor, nessa cena, é mostrar o momento em que o personagem decide pegar um táxi e ir ao enterro do pai. Onde posicionar a câmera, afinal? Bem, se o personagem chora ao dizer “Vou pegar um táxi”, e se mostrar o choro é importante para gerar emoção na cena, então é preciso colocar a câmera próxima ao rosto do personagem.

Quer dizer, se é importante que o público veja a lágrima caindo, de que adianta uma câmera que mostre somente os carros que passam na rua? Por mais bonita que possa ser uma imagem de cima de um prédio, mostrando a rua movimentada lá em baixo, de que ela vale, se não captou a lágrima de nosso personagem, se não foi capaz de transmitir sua emoção para quem assiste ao filme?

As posições de câmera e seus movimentos sempre estão em função do contexto e/ou do sentimento da cena. Se a imagem se aproxima de um rosto ou de um objeto, é porque ali existe algo importante para ser mostrado.

Enfim, um diretor não escolhe a imagem mais bonita. Escolhe a maneira mais bonita de contar a história que precisa contar, de passar o sentimento que deseja passar. Um plano simples, mas forte simbolicamente, que contribui com a narrativa, vale mais que mil planos lindíssimos e vazios de significado no contexto do filme.



Texto: Henry Grazinoli
Consultoria de conteúdo: Laís Bodanzky

domingo, 4 de setembro de 2011

DIRIGIR E DELEGAR

DIRIGIR E DELEGAR

O cinema é a somatória de informações, sensibilidades, pontos de vista e ideias de uma grande equipe que trabalha por um mesmo objetivo: fazer um filme. A filmagem começa muito, muito antes do set de filmagem.

Primeiro, vem a ideia – que pode ou não sair da cabeça do diretor. Depois, vem a redação do roteiro, feita por um roteirista, pelo próprio diretor ou por uma parceria entre os dois. Quando o roteiro entra em processo de virar imagem, há um encontro no qual o diretor lê sua história para todos os chefes da equipe – diretor de arte, diretor de fotografia, assistente de direção, produtor, técnico de som – e explica o conceito do filme, cena a cena. Nessa reunião, chamada análise técnica, o diretor abre seu baú, mostra suas referências, e cada núcleo começa a desempenhar sua função.

A partir daqui, pensando no grande organismo vivo que é a realização cinematográfica, podemos dizer que a equipe corresponde aos braços, aos olhos e aos ouvidos do diretor, que precisa escolher e juntar todas as informações, em nome da unidade da obra. Essa soma de esforços e olhares, quando bem direcionada, aprofunda e enriquece o processo de trabalho e o resultado final.

De posse de todas as informações e possibilidades apresentadas pela equipe, o diretor precisa decidir o que funciona e o que não funciona. Precisa estar preparado para responder a todas as dúvidas em relação ao filme que possam surgir, em todas as etapas da produção. No set, isso é amplificado e, cercado por toda a equipe, o diretor precisa ter muita presença de espírito, raciocínio rápido e domínio da temática que está abordando para que o barco não saia do rumo e naufrague mais adiante.

É preciso estar atento a tudo o que acontece no set, locação ou estúdio. Saber ouvir as sugestões do fotógrafo e do diretor de arte. Ter controle sobre o tempo e tomar decisões rapidamente. Além disso, o diretor precisa administrar o clima no set, passando confiança, tranquilidade e harmonia para toda a equipe – afinal, com um bom processo de trabalho, a chance de realizar um bom filme aumenta consideravelmente.

É cada vez mais rara a figura do diretor centralizador, genioso, que escraviza a equipe em nome de suas ideias, que sangra os atores para obter atuações intensas, que transforma a vida dos parceiros de trabalho num inferno. Na contramão dessa figura estereotipada, o diretor que ganha espaço, nos dias de hoje, é aquele que oferece boas referências para que sua equipe trabalhe com autonomia e contribua no processo de criação. É aquele que administra o set de filmagem conhecendo e respeitando o outro, buscando sempre aproveitar o que cada pessoa tem para oferecer de melhor. É aquele que acompanha a montagem e a sonorização sempre aberto a um olhar especializado e criativo dos profissionais dessas áreas.

Liderar uma equipe com essa consciência e generosidade talvez seja a atribuição mais importante de um diretor de cinema.

Texto: Henry Grazinoli
Consultoria de conteúdo: Laís Bodanzky